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27 de setembro de 2011

A prática da vida cristã deve ser a do amor - generosidade

Os nossos critérios de ação devem ultrapassar a realidade unicamente humana. Na origem das atitudes há os dados da ética e da moral, mas também as questões divinas que estão relacionadas com as questões da fé.

Ser generoso não é simplesmente ser justo, mas atender às necessidades de quem está em jogo. Não é fato apenas de merecimento e de justiça, mas de solidariedade e de partilha de forma fraterna, para que todos tenham vida digna.

O mundo é como um terreno onde se planta de tudo. É daí que tiramos os alimentos. Mas todos devem trabalhar, uns mais e outros menos, dependendo das condições de cada pessoa. Os frutos são para sustento da coletividade e de forma solidária.
Para o trabalho, há pessoas que chegam cedo, outras trabalham menos, mas ambos têm necessidade de vida e de alimento. Na partilha, ninguém pode ser injustiçado, mesmo que alguém receba além do que é justo por não ter trabalhado o tempo todo.

Jesus conta a parábola do patrão que combinou o salário do dia com um trabalhador. Outros foram chegando ao transcorrer do dia, havendo até quem chegasse ao final da tarde. A ambos o patrão pagou o mesmo valor. Ele agiu com justiça e com generosidade.

No mundo capitalista as atitudes são diferentes, mesmo sabendo da existência de quem partilha com os trabalhadores os lucros da empresa. No mundo de Deus, a ternura e a generosidade ultrapassam as nossas, a lógica é diferente do que fazemos.

A prática da vida cristã deve ser a do amor, com capacidade de doação maior do que aquilo que merecemos. É a misericórdia, a paciência, a compaixão, a bondade e a justiça, tendo como objetivo viver bem, tendo uma vida que faça sentido.

Para Deus, a partilha não é matemática, nem é mesquinha, porque Ele olha a necessidade da pessoa. A bondade do Senhor ultrapassa os critérios humanos e Seus dons são sem medida. O que importa não é o que fazemos, mas a forma como fazemos as coisas.


Fonte: Dom Paulo Mendes Peixoto

Os caminhos do Senhor - Somos livres para recusar os dons de Deus

As formas de Deus agir, sempre manifestadas quando Ele se revela, são diferentes do jeito de ser da pessoa humana. O Seu projeto passa a constituir-se como proposta para o nosso proceder.
As respostas que damos a Ele devem ser de forma consciente e livre.

As pessoas têm plena liberdade para atender o chamado feito pelo Senhor. Elas devem dizer um "sim" que realmente seja "sim", com autenticidade e coração livre. Muitos trocam seu "sim" pelo "não", deixando de realizar o bem como primeira proposta assumida.

Somos livres para recusar os dons de Deus, podendo até agir de forma contrária, evidenciando nosso orgulho próprio. Foi o que aconteceu com o filho que disse “sim” e acabou realizando o “não”, contrariando a vontade de seu pai.

Pelo nosso livre-arbítrio, podemos escolher fazer o bem ou o mal. Tendo feito a escolha, somos também capazes de mudar de rumo. Isso é sinal de que temos limitações e nunca estamos prontos e totalmente certos sobre o caminho que devemos percorrer.

Diante de tudo isso, o seguimento do caminho do Senhor supõe frequente revisão de vida. É um processo de conversão constante, de discernimento sobre o que seja melhor a ser realizado, e que traga consequências realmente positivas para o bem comum.

Para agir bem é preciso afastar de nós a arrogância e o egoísmo, porque eles ameaçam a convivência e criam privilégios. Com isso deixamos de ser servos. A prática da humildade faz a diferença na construção de uma comunidade fraterna e humana.

Nos caminhos do Senhor temos que evitar uma prática religiosa intimista, que tem um olhar voltado para Deus sem dar importância ao irmão com quem convivemos. É o perigo da prática vertical sem dimensão horizontal da fé, sendo ação apenas subjetiva. Assim caímos facilmente na ideologia da prosperidade, muito falada hoje, de olhar para si mesmo sem dar conta de que os caminhos do Senhor passam pela vida de comunidade. Deus quer nosso trabalho e luta para conquistarmos os bens necessários de sobrevivência.



Fonte: Dom Paulo Mendes Peixoto

22 de setembro de 2011

A EXISTÊNCIA DE DEUS !

Damico era dono de uma bem sucedida farmácia numa
cidade do interior.
Era um homem bastante inteligente mas não acreditava
na existência de
Deus ou de qualquer outra coisa além do seu mundo
material.
Um certo dia, estava ele fechando a farmácia quando
chegou uma criança
aos prantos dizendo que sua mãe estava passando mal e
que se ela não
tomasse o remédio logo iria morrer.
Muito nervoso e após insistência da criança, resolveu
reabrir a farmácia
para pegar o remédio.
Sua insensibilidade perante aquele momento era tal que
acabou pegando o
remédio mesmo no escuro, entregou-o à criança, que
agradeceu e saiu dali
às pressas.
Minutos depois, percebeu que havia entregado o remédio
errado para a
criança e, se aquela mãe o tomasse, morte instantânea.

Desesperado, tentou alcançar a criança mas não teve
êxito.
Gritou em desespero... e o tempo passava e nada
acontecia.
Sem saber o que fazer e com a consciência pesada,
ajoelhou-se e começou
a chorar e dizer que se realmente existia um Deus que
não o deixasse
passar por assassino.
O tempo passava e ele, de joelhos ficava pensando que
a mulher poderia
já estar morta e, certamente, ele teria de pagar por
isso.
Refletiu sobre suas intemperança, sobre seu mau humor,
principalmente
sobre sua insensatez.
De repente, sentiu uma mão tocar-lhe o ombro esquerdo
e ao virar
deparou-se com a criança em prantos.
Naquele momento ficou desconsolado.
Mas tinha uma certeza: Deus, de fato, não existia.
Já podia imaginar o que estava para lhe acontecer.
O choro e o olhar triste daquela criança lhe
atravessava a alma.
No entanto, como um lampejo de sabedoria, perguntou ao
menino o que lhe havia acontecido.
Então aquela criança começou a dizer:
- "Senhor, por favor não brigue comigo, mas é que caí
e quebrei o vidro
do remédio, dá pro senhor me dar outro?"
---


Deus existe e te conhece pelo teu nome.
Ele sempre tem o melhor para você, por mais que as
circunstâncias
mostrem o contrário.
Creia neste amor que é maior do que qualquer um dos
seus problemas,
mesmo que estes sejam grandes e de difícil resolução.
Creia na vida melhor que Ele tem preparada para você!
Creia neste amor!
Creia em todos os instantes deste dia como se fossem
milagres realizados
só para você, pois você é, com toda certeza, um dos
milagres de Deus
aqui na Terra.


Fonte: hais (Equipe de Crisma)


Deus é como açucar

Um certo dia, a professora querendo saber se todos tinham estudado a lição dominical, perguntou as crianças quem saberia explicar quem é Deus.

Uma das crianças levantou o braço e disse:

- Deus é o nosso pai, Ele fez a terra, o mar e tudo que está nela; nos fez como filhos dele.
A professora, querendo buscar mais respostas, foi mais longe:
- Como vocês sabem que Deus existe, se nunca o viu?
Pedro, um menino muito tímido, levantou as mãozinhas e disse:
- A minha mãe me disse que Deus é como o açúcar no meu leite que ela faz todas as manhãs, eu não vejo o açúcar que está dentro da caneca no meio do leite, mas se ela tira, fica sem sabor. Deus existe, e está sempre no meio de nós, só que não o vemos, mas se ele sair de perto, nossa vida fica... sem sabor.
A professora sorriu e disse:
- Muito bem Pedro, eu ensinei muitas coisas a vocês, mas você me ensinou algo mais profundo que tudo o que eu já sabia. Eu agora sei que Deus é o nosso açúcar e que está todos os dias adoçando a nossa vida!
Deu-lhe um beijo e saiu surpresa com a resposta daquela criança.
A sabedoria não está no conhecimento, mas na vivência de DEUS em nossas vidas, pois teorias existem muitas, mas doçura como a de DEUS não existe e nunca existirá, por isso deixe que Ele adoce sempre sua vida...

Fonte: Andréia

Meditando a oração do Pai-Nosso

Como posso dizer PAI-NOSSO...
Se não vejo todas as pessoas como meus verdadeiros irmãos.
Se eu penso somente em mim, não posso dizer Pai Nosso.
Tenho olhado todas as pessoas como meus verdadeiros irmãos?
Até mesmo aqueles que me prejudicam? Ou só penso em mim?

Como posso dizer QUE ESTAIS NO CÉU...
Se eu não acredito na vida eterna!
Se eu não acredito que Jesus está verdadeiramente vivo!
Tenho dado exemplos principalmente para meus filhos que realmente acredito na vida eterna e que Jesus está verdadeiramente vivo?
Ou tenho me acomodado?
Tenho esquecido que deixar de participar da Santa Missa para fazer qualquer outra coisa é negar que Jesus está vivo.

Como posso dizer SANTIFICADO SEJA O VOSSO NOME...
Se não procuro santificar a minha vida!
Se não procuro santificar a mim mesmo.
Tenho procurado santificar a minha vida?
Tenho procurado santificar a vida de todos aqueles que convivem comigo?
Tenho procurado santificar a minha família, minha esposa ou meu marido, meus filhos...?
Ou tenho achado mais fácil me acomodar?

Como posso dizer VENHA A NÓS O VOSSO REINO...
Seu só penso em ter, mesmo que para isso tenha que passar outras pessoas para traz.
Tenho sido verdadeiramente honesto com todas as pessoas para poder dizer venha a nós o vosso reino?
Ou tenho pensado só em ter?

Como posso dizer SEJA FEITA A VOSSA VONTADE ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU...
Se na maioria das vezes eu só penso na minha vontade, muitas das vezes sem olhar se estou ou não prejudicando meu irmão.
Se eu nunca procuro fazer a vontade de Deus!
Como posso dizer que seja feita a sua vontade?
Tenho procurado fazer de minha vida a vontade de Deus?
Tenho sido humilde e realmente aceitado a vontade de Deus?
Ou por qualquer motivo reclamo e às vezes até me revolto?

Como posso dizer O PÃO NOSSO DE CADA DIA NOS DAÍ HOJE...
Se eu quero o pão de hoje, o pão de amanhã, o pão de daqui um ano, o pão de sempre e ás vezes até o pão de meu irmão.
Tenho agradecido a Deus pelo pão de hoje, para que ele nunca me falte?
Ou tenho procurado ganhar o pão de hoje, o pão de amanhã, o pão de daqui um ano ou quem sabe até o pão de sempre!
Mesmo que para isso tenha que explorar o meu irmão mais fraco, às vezes até tirando o seu único pedaço de pão. Realmente tenho que pensar melhor quando digo “O pão nosso de cada dia nos daí hoje”

Como posso dizer PERDOAI-NOS AS NOSSAS OFENSAS, ASSIM COMO NÓS PERDOAMOS A QUEM NOS TEM OFENDIDO...
Se eu não sei perdoar!
Se por qualquer motivo eu viro o rosto para meu irmão!
Se por qualquer motivo eu fico sem falar com outras pessoas!
Muitas das vezes não sei compreender até mesmo meus familiares.
Tenho perdoado a todos que me ofendem, que me magoam...?
ou tenho sido um hipócrita em ter coragem de virar para Deus e pedir que Ele me perdoe como eu perdôo?
Realmente tenho que prestar mais atenção quando estou rezando.
Como posso dizer NÃO NOS DEIXEIS CAIR EM TENTAÇÃO...
Se eu não faço a minha parte, se na maioria das vezes eu sempre procuro aquilo que me afasta de Deus e que me leva a pecar.
Tenho feito a minha parte, me afastando de lugares indevidos?
Lugares que não serviriam de exemplos para meus filhos, fazendo coisas que um dia possa vir a me arrepender!
Quando peço a Deus para não me deixar cair em tentação também tenho que fazer a minha parte e não ir ao encontro dela.
Como posso dizer LIVRAI-NOS DO MAL...
Se eu não fujo do pecado! Se muitas das vezes até vou ao encontro dele!
Tenho procurado fugir de todo tipo de mal, de tudo que leva a pecar?
Ou tenho ido ao seu encontro?
Tenho ensinado a meus filhos a fugir do pecado?
Ou meus exemplos não são tão bons?
Como posso dizer AMÉM se não tenho feito a minha parte?

Oração

Senhor, que a partir de hoje, que a partir desse momento, eu possa nos meus momentos de oração, refletir mais sobre o que estou falando, pois Senhor eu quero realmente viver a oração que o seu filho nos ensinou. Que eu possa realmente te chamar de Pai, que eu possa Senhor fazer com que todos vejam que estais no céu e que eu santifique a minha vida para poder dizer santificado seja o vosso nome.
Eu quero Senhor dizer venha a nós o vosso reino de coração, para que o Senhor reine dentro de mim e em toda minha vida. Para que eu Senhor, possa falar de coração sincero, que seja feita a Tua vontade assim na terra como no céu.
Que eu saiba louvar e agradecer todos os dias de minha vida, pelo pão que recebo e também pedir para que ele nunca falte na mesa de nenhum de meus irmãos.
Que eu saiba Senhor perdoar o meu irmão de coração, assim como o Senhor nos perdoa, que eu procure sempre me afastar de todo tipo de tentação, para que o Senhor me livre de todo tipo mau. AMÉM!


Fonte:  Dirceu Alvez

Firmes na fé

Sede pacientes na tribulação e perseverantes na oração

Embora o ato de fé tenha características de racionalidade, não há dúvida de que, por ele, entramos no âmbito do sobrenatural.
Vale dizer que a fé nos introduz no mundo do mistério, não muito fácil de ser explicado. Só um ser racional pode ter fé, pois isso envolve uma qualidade divina, que apenas os seres constituídos “imagem e semelhança de Deus” podem ter: a liberdade.

Como explicar esse ato, que está no fundo do coração humano, de confiar, de maneira livre e inabalável, numa pessoa? A fé, antes de ser esforço e busca do ser humano, é dom gratuito, oferta do Grande Ser de toda a criação. Com isso fica claro que a nossa resposta é o ato segundo, porque o ato primeiro é a graça que nos vem do Ser Amoroso.

Crer não é aderir a verdades. É aceitar uma Pessoa, Nosso Senhor Jesus Cristo. Por isso, vejam bem, na oração do Credo rezamos primeiro “creio no Espírito Santo”, para só depois dizermos que “creio na Igreja Católica”. Assim estamos dizendo que cremos na Igreja, por ser obra Espírito Divino.

No ato de acreditar está sempre embutida, com mais força ou menos, a dúvida. Esta é tanto maior quanto menos tivermos a humildade de rezar e também de estudar. No entanto, além das dúvidas, pode aparecer um problema muito maior, que é o abalo de nossa confiança em Deus. A isso podemos ficar expostos nas grandes tribulações.

Numa grande enchente, num cruel terremoto, numa seca interminável, nos horrores da guerra, na miséria extrema, só ainda o coração fiel é capaz de se agarrar ao Senhor e exclamar: “Olha para mim, Senhor” (Jer 18, 19).

Quem não acredita que Deus é capaz de fazer brotar o bem de um grande mal corre o risco de abandonar a sua fé. Como também podem ocorrer males dentro da comunidade católica: desentendimentos com os líderes religiosos, desavenças dentro da paróquia, injustiças reais ou imaginárias, desprezo pelos pobres. E aí vem a grande tentação: não crer mais na Igreja Católica, e aderir a outras denominações religiosas (como se nessas não acontecessem problemas). “Sede pacientes na tribulação e perseverantes na oração” (Rom 12, 12). Apesar disso, quantos no Brasil abandonaram a sua fé na Igreja e buscaram outros grupos de fiéis. Isso nos entristece.

Dom Aloísio Roque Oppermann scj -

Como deve ser a catequese?

A revelação e clareza do caminho de Cristo
A Moral católica é a base do comportamento do cristão; por isso é ensinada na catequese, de modo que o cristão, conhecendo os dogmas da fé e celebrando na liturgia os Sacramentos da salvação, viva também conforme as leis de Deus. O Catecismo da Igreja Católica ensina como deve ser a catequese (CIC §1697): “Importa, na catequese, revelar com toda clareza a alegria e as exigências do caminho de Cristo (Cf. CT 29).

A catequese da “vida nova” (Rm 6,4) em Cristo será:

1 - Uma catequese do Espírito Santo, Mestre interior da vida segundo Cristo, doce hóspede e amigo que inspira, conduz retifica e fortifica esta vida. O Espírito Santo convence o cristão da beleza da “Lei de Cristo”, e o faz vivê-la com gosto, sem peso; é um jugo suave e um fardo leve que verdadeiramente liberta dos pecados e dos vícios e o conduz à santidade.

2 - Uma catequese da graça, pois é pela graça que somos salvos, e é pela graça que nossas obras podem produzir frutos para a vida eterna; sem a graça de Deus o homem não pode vencer a fraqueza da natureza humana prejudicada pelo pecado original. A graça de Deus alimenta e fortalece nossas disposições naturais para vivermos segundo a vontade de Deus.

3 - Uma catequese das bem-aventuranças, pois o caminho de Cristo se resume às bem-aventuranças, único caminho para a felicidade eterna, à qual o coração do homem aspira. No Sermão da Montanha Cristo traçou a “Constituição do Reino de Deus”, a Carta Magna do cristão; a lei da santidade.

4 - Uma catequese do pecado e do perdão, pois, sem se reconhecer pecador, o homem não pode conhecer a verdade sobre si mesmo, condição do reto agir, e sem a oferta do perdão não poderia suportar essa verdade. Reconhecendo-se pecador, e acolhendo o perdão de Deus pelo sangue de Cristo por nós derramado, o cristão se vê livre da pior realidade deste mundo: o pecado. Cristo veio exatamente “para tirar o pecado do mundo” (Cf. Jo 1, 29); Ele é o Cordeiro de Deus que aceitou ser imolado para curar a lepra da nossa alma e nos reconciliar com Deus.

5 - Uma catequese das virtudes humanas, que faz abraçar a beleza e a atração das retas disposições em vista do bem. No lado oposto dos pecados capitais (soberba, ganância, luxúria, gula, ira, inveja e preguiça),o cristão deve viver as “virtudes capitais” (humildade, desprendimento, pureza, temperança, bondade, diligência), que trazem a felicidade a seu coração.

6 - Uma catequese das virtudes teologais da fé, esperança e caridade, que se inspira com prodigalidade no exemplo dos santos. Essas virtudes são relacionadas ao próprio Deus, por isso são teologais; a fé que vem de Deus (“Sem fé é impossível agradar a Deus”); a esperança que nos conduz ao céu, a vida eterna em Deus; e o amor que é a própria realidade de Deus.

7- Uma catequese do duplo mandamento da caridade desenvolvido no Decálogo. São Paulo disse que “a caridade é vínculo da perfeição”, e que, “quem vive a caridade cumpre toda a lei”. Todos os mandamentos foram reduzidos pelo Senhor em: "Amar a Deus sobre todas as coisas e amar o próximo como a si mesmo". Esta é a Lei e os Profetas.

8 - Uma catequese eclesial, pois é nos múltiplos intercâmbios dos “bem espirituais” na “comunhão dos santos” que a vida cristã pode crescer, desenvolver-se e comunicar-se. Cristo instituiu a Igreja para levar a salvação a todos os homens de todos os tempos e lugares até que Ele volte; por isso a Igreja é “o sacramento universal da salvação”; ela é necessária para a salvação; sem ela não há os sacramentos da salvação. A catequese deve ensinar o Credo da Igreja, os Sacramentos da Igreja, a Moral da Igreja, a Liturgia da Igreja e a Oração da Igreja.

Esses são os princípios básicos que não podem faltar em uma boa catequese, fiel ao que Cristo Jesus nos ensinou e quer que a Igreja transmita a seus filhos para que sejam salvos.


Fonte: Felipe Aquino

A orientação sexual na adolescência


Ensinemos aos jovens o autocontrole de suas paixões
A orientação sexual na adolescência ganha cada vez mais importância. Mais do que transmitir que sexo por sexo é fuga e sexo com consciência é amor, discutir as formas de relacionamento entre adolescentes é também uma das grandes preocupações da sociedade. Causa estranheza observar o descaso e o desrespeito com que o assunto ainda é tratado. Nem é preciso ser um especialista para perceber a discrepância das atitudes.

A sociedade vem se preocupando em proporcionar segurança e liberdade sexual para os adolescentes, mas não consegue orientar adequadamente os representantes do futuro da nação sobre o assunto. Isso sem contar a forma com que o tema é tratado na mídia, principalmente em novelas, filmes nacionais e em programas de auditório. Sem contar que, associada à distribuição gratuita dos preservativos e da abortiva “pílula do dia seguinte”, a liberdade de atos sexuais entre adolescentes torna-se cada vez mais normal, como um incentivo à promiscuidade.

O ser humano não deve ser considerado apenas como um corpo. Sua alma necessita de afago. A simples promoção de sexo acintoso, sem responsabilidade e sem compromisso, também incita consequências trágicas como milhões de meninas gerando filhos, sendo violentadas, prostituindo-se à beira das estradas, crianças abandonadas por pais e mães despreparados para formar uma família e postadas em faróis à procura do sustento de cada dia. É claro, quem planta vento colhe tempestades.

A moral e a ética exigem que ensinemos aos jovens o autocontrole de suas paixões intensas. Que devem vencer a Aids e outras doenças sexualmente transmissíveis com atos responsáveis e não pelo uso da camisinha. João Paulo II assim se expressou sobre a camisinha: “Além de o uso de preservativos não ser 100% seguro, liberar o seu uso convida a um comportamento sexual incompatível com a dignidade humana […]. O uso da chamada camisinha acaba estimulando, queiramos ou não, uma prática desenfreada do sexo […]. O preservativo oferece uma falsa ideia de segurança e não preserva o fundamental”.
Devemos incentivar a formação de famílias com conceitos, raízes e sentimentos puros e morais. Conservadora ou não, a família é o sustento do espírito e a fonte de conforto nos anseios individuais.

A sociedade, de maneira geral, deve ter mais cuidado com o que simplesmente “controla a transmissão de doenças e evita filhos indesejados”. Ela deve transmitir princípios e valores por intermédio da orientação, em busca do resgate das origens e do respeito à moral e à ética.

A satisfação do sexo não está restrita ao corpo, ela deve estar atrelada ao coração, espírito e mente.

Fonte: Felipe Aquino

19 de setembro de 2011

Os perigos de uma leitura superficial

As etapas para o entendimento bíblico

“Concedei a vosso servo esta graça: que eu viva guardando vossas palavras” (Salmo 118,17).

Segundo o documento da Comissão Pontifícia Bíblica: A interpretação da Bíblia na Igreja ainda que os estudiosos bíblicos tenham a função de interpretar as Sagradas Escrituras, esse trabalho não compete somente a eles, pois a leitura e a vivência dos textos bíblicos vão além das análises acadêmicas, já que os Livros Sagrados não são apenas um conjunto de livros históricos, mas, a Palavra de Deus.

E essa Palavra se torna atual e responde aos questionamentos e angústias do homem pós-contemporâneo. Por isso, a leitura e o estudo bíblico devem ser feitos por todos, uma vez que proporcionam uma experiência de fé prática e atual. Mas também é preciso tomar certos cuidados e ter critérios na leitura e na interpretação desses textos, para que não haja o risco de uma interpretação desvinculada e sem compromisso com a Tradição e com o Magistério da Igreja, pois ambos garantem um entendimento seguro das Sagradas Escrituras ao longo da história de fé do Povo de Deus.

Para isso, torna-se necessário tratar de algumas questões ligadas à exegese e à hermenêutica bíblicas. Mas não é preciso espanto, pois essas palavras [exegese e hermenêutica] estão mais presentes na prática bíblica do que se possa imaginar. E também não se trata aqui de um estudo científico, pois o uso dessa linguagem é para mostrar as etapas necessárias para um correto entendimento da Bíblia.

Comecemos, então, pela definição desses termos: “Exegese” é uma palavra que vem do grego e significa “explicação ou explanação”. É a arte de expor, de trazer para fora o sentido de um determinado texto. É um conjunto de técnicas e ferramentas utilizadas para entender e descobrir o significado de um texto. “Hermenêutica” já diz respeito à interpretação do que está escrito. É a apropriação que se faz do entendimento do texto para aplicá-lo no dia a dia.

Mas existe no meio do caminho entre a exegese e a hermenêutica um filtro. E que filtro é esse? A Doutrina da Igreja apresentada através do Catecismo da Igreja Católica. Esse procedimento de filtrar o estudo bíblico serve basicamente para duas coisas: não permitir os exageros e também para ampliar a interpretação quando esta é muito limitada. E, em geral, ele amplia muito mais do que reduz as interpretações, uma vez que são apresentadas outras possibilidades de entendimento do texto que talvez não tenham sido contempladas no estudo.

É como o antigo filtro de barro muito usado, especialmente, nas cidades pequenas e nas zonas rurais. Esse utensílio doméstico não é feito para reter a água, mas para purificá-la. Do mesmo modo, o “filtro” da Doutrina da Igreja não retém a nossa leitura bíblica, mas a deixa livre de impurezas que porventura possam ter surgido durante o momento de estudo [da Palavra de Deus]. Além disso, o filtro de barro possui a capacidade de deixar a água sempre fresca e pronta para ser consumida. Igualmente faz o “filtro” da Doutrina atualizando para nossos dias aquilo que lemos e interpretamos nas Sagradas Escrituras e deixando a mensagem bíblica pronta para saborearmos e utilizarmos no cotidiano.

Que se sigam essas três etapas para o entendimento bíblico: estudar com atenção, trazendo à tona o máximo de informações possíveis para um conhecimento mais aprofundado do texto bíblico – passar esse conteúdo pelo “filtro” da Doutrina a fim de purificar e atualizar o conteúdo – e aplicar a Palavra de Deus na própria vida.

Ler superficialmente o texto das Sagradas Escrituras, sem um mínimo de contextualização e sem consultar a Igreja, nos faz correr o risco de uma aplicação equivocada dele, podendo causar danos a nós mesmos e àqueles a quem o transmitimos. Daí a importância desses três momentos: estudo mais cuidadoso (exegese) – filtro da Doutrina (Catecismo) – interpretação e aplicação no dia a dia (hermenêutica).

Fonte: Denis Duarte

Como você tem acolhido a Palavra de Deus em seu coração?

Nestes últimos tempos, o Senhor tem derramado Sua Palavra em profusão. Você tem recebido muito.
Mas é o momento de se perguntar: “Como tenho recebido tudo isso?” O que o Senhor lhe dá é sempre precioso, uma semente boa que tem em si toda a capacidade de gerar frutos. Que tipo de terreno tem sido seu coração? O próprio Jesus se preocupa com isso. Então, apresenta a Parábola do Semeador:

“Enquanto semeava, algumas sementes caíram à beira do caminho; e os pássaros do céu vieram e comeram tudo. Outras caíram em sítios pedregosos, onde não havia muita terra; logo brotaram, porque a terra era pouco profunda; mas, quando o sol se levantou, ficaram queimadas e por lhes faltarem raízes, secaram. Outras caíram entre os espinhos; os espinhos cresceram e as sufocaram. Outras caíram na terra boa e deram fruto, uma cem, outra sessenta, outra trinta por um. Quem tiver ouvidos, ouça!” (Mateus 13,4-9).

O próprio Jesus explicou aos discípulos o significado profundo dessa parábola:
“Vós, portanto, ouvi a parábola do semeador. Aquele que ouve a Palavra do Reino e não compreende, porque o maligno vem e se apodera do que foi semeado no seu coração, é o que recebeu a semente à beira do caminho. Aquele que recebeu a semente em lugar pedregoso é o que, ouvindo a Palavra, logo a acolhe com alegria; mas não tem raízes em si, é homem de momento: mal chega a tribulação ou a perseguição por causa da Palavra, ele cai. Aquele que recebeu a semente entre os espinhos é o que ouve a Palavra, mas o cuidado do mundo e a sedução das riquezas sufocam a Palavra, e ele fica sem fruto. O que recebeu a semente na terra boa é o que ouve a Palavra e compreende: então, ele dá fruto e produz, um cem, outro sessenta, outro trinta por um (Mateus 13,18-23).

É o momento de se perguntar: “Que tipo de terreno tenho sido?” Existe aquele terreno que acolhe a Palavra, mas não a retém, não a guarda, recebe a Palavra apenas festivamente (com leviandade), mas não a acolhe, não tem profundidade. Então, o que acontece? Lá está o demônio, girando em torno dele, querendo arrancar-lhe a semente da Palavra. O demônio age sempre assim, não quer que a Palavra caia em seu coração e produza frutos em sua vida. Como ave faminta, procura sempre arrebatar a semente quando ela começa a frutificar.

Pode ser que você viva assim: vai à Santa Missa, a reuniões, ao grupo de oração, faz palestras, participa de dia de louvor, de encontros, mas tudo apenas festivamente. A Palavra cai em você, mas passa como aguaceiro. Cai, passa e não deixa resultados. Logo vem satanás, retira a Palavra e a leva embora sem que ela faça seu papel em sua vida.

Você pode ser um desses terrenos. Todos nós corremos esse risco: não acolher o tesouro da Palavra. A consequência é que você acaba sendo mais um festivo no Reino de Deus. Faz muita festa, movimentação, barulho, sem nenhum silêncio, sem profundidade: sem verdadeiro acolhimento.

Há outro tipo de terreno: o sol pedregoso. A Palavra caiu e você a acolheu com alegria, mas não a deixou que fincasse raízes. O próprio Jesus explica essa inconstância: sobrevindo uma dificuldade, um problema, uma tribulação ou perseguição por causa dela [Palavra], logo você a deixa. E como temos agido assim! Parece que não temos força nenhuma, nem qualquer coragem, somos cristãos sem fibra, sem têmpera, pensando que Deus Pai deve nos tratar como “filhinhos de papai” retirando todas as dificuldades e os problemas do nosso caminho. Diante da primeira tribulação, somos já terreno pedregoso, onde a Palavra não pode fincar raízes.

Outro tipo de terreno é aquele cheio de espinhos. Você ouviu bem a Palavra, com alegria, recebeu, acolheu, mas os cuidados do mundo e a sedução das riquezas a sufocam e a tornam infrutuosa.

Infelizmente, isso tem acontecido com muita gente! Recebem a Palavra, passam pela conversão, são batizados no Espírito Santo, os dons afloram... mas os cuidados deste mundo, os trabalhos, os afazeres, as riquezas, o conforto, o comodismo, os compromissos sociais e tantas outras coisas vão sufocando a graça recebida e tudo vai embora.

Muitos cristãos começaram bem, caminharam por um bom tempo, mas não abriram mão da vida que viviam, do caminho que estavam trilhando. Quiseram ser cristãos, mas ao mesmo tempo, viver a vida antiga. Então, tudo que receberam se esvaziou. Os compromissos sociais, as reuniões, as festas, o conforto, a necessidade de ter mais dinheiro, a necessidade de seguir a moda, tudo isso foi sufocando a Palavra, a graça, o Espírito Santo com Seus dons e frutos... e tudo se foi. Será que você não tem sido esse terreno?

Por fim, Jesus fala da semente caída num terreno bom. Ele nem fala de um terreno especial, mas de um terreno bom em que a semente caiu e frutificou. Um terreno que acolheu a Palavra e produziu frutos. É preciso que sejamos assim!

Você tem recebido muito, graças a Deus! O Senhor está investindo em você. Não desperdice a graça tão abundante que tem sido derramada em sua vida.

(Trecho do livro “O Pão da Palavra – volume 2” de monsenhor Jonas Abib)

A Palavra precisa de ouvintes e de anunciadores

A Palavra de Deus não pode cair no chão, mas nos corações através do ouvido. A Palavra precisa de ouvintes e de anunciadores. Estes emprestam sua voz para que a Palavra seja ouvida e os ouvintes recorram ao silêncio para a escuta de Deus que fala e revela seu amor.

O ouvinte da Palavra, faz a experiência da “encarnação da Palavra. Grande é o poder da Palavra em nosso ser, a saber: ouvido de discípulo, coração de enamorado (arde o coração), língua de profeta, mão de samaritano, pés missionários. A Palavra transforma todo o nosso ser. Ela se faz carne em nossas pessoas.

A Igreja sempre venerou as Sagradas Escrituras do mesmo modo como fez com o Corpo do Senhor. Cristo vive e fala na Palavra. Quando se lêem as Escrituras, é Cristo que fala. Daí a necessidade de bons microfones, leitores preparados, boa acústica, boa comunicação.


A Palavra de Deus é uma palavra amiga, verdadeira, viva, eficaz, fecundante, transformante, informativa, formativa, apelativa, recriadora, eterna, salvadora, santificadora, reveladora. Esta Palavra Santa é inesgotável, permanente como a sarça ardente.

A Palavra protegida pelo “Não”. Não falsificar a Palavra, não acorrentar, não emudecer, não manipular, não silenciar, não ocultar, não ler mal, não ignorar, não prejudicar, não envelhecer, não deformar, não domesticar, não ajeitar, não ideologizar, não mudar, não dificultar o acesso à Palavra de Deus.

Bíblia, carta de amor é: Livro da vida. Livro da verdade. Livro da amizade. Livro da salvação. Não é livro morto. Não é livro velho. Não é livro apenas de estudos e consulta. Não é livro de curiosidades. Não é livro de brigas religiosas. Não é livro como outros livros.

A Igreja deve ouvir piamente, guardar santamente, expor fielmente a Palavra de Deus para que o mundo creia, acreditando espere e esperando ame. A Palavra ilumina as mentes, fortalece as vontades, inflama os corações no amor de Deus.

Precisamos ter familiaridade com as Escrituras Sagradas, apegarmo-nos a elas, pois tudo foi escrito para nossa instrução e esperança. A Palavra é sustentáculo da Igreja, alimento da alma, solidez da fé, fonte de vida espiritual.

Que a Palavra corra veloz (II Tess. 3,1), não seja acorrentada, chegue aos confins da terra e sobre os telhados. A “voz” da Palavra é a revelação. O “rosto” da Palavra é Jesus Cristo. A “casa” da Palavra é a Igreja. Os “pés” da Palavra são as missões e caminhos da missão.

O cristão é convocado a ouvir a Palavra. E também: compreender. Assimilar. Renunciar. Obedecer. Anunciar. Permanecer. Reescrever. Praticar. Dar fruto. Perseverar. Fazer o que diz a Palavra. Sim, a Palavra se fez livro, mas precisa fazer-se carne em nossa carne. Pronunciamos a Palavra com nossa vivência e boas obras, com nosso testemunho.

A Palavra é tão excelsa e alta como o céu infinito, e tão profunda como o abismo insondável. Ela é pão, luz, mel, leite, ouro, martelo, espada, chuva, carta, semente, colírio. Estes são símbolos que nos ajudam descobrir o tesouro inestimável da Palavra. O lugar da Palavra é nossa mão, nosso coração e nos pés para a missão.

Somos aquilo que ouvimos. O coração do verdadeiro cristão é “uma biblioteca bíblica”. Na Bíblia, a Igreja ouve as declarações de amor do Amado. Era costume em alguns mosteiros o Abade perguntar aos monges após a meditação da Palavra: “O que comeste hoje?” A Bíblia é pão, é nutrição, alimento diário. A Palavra de Deus é inesgotável, não envelhece, é como a sarça ardente que não se consome, não passará. Eis a inesgotabilidade da Palavra de Deus. Os irmão protestantes leem a Bíblia, os católicos falam da Bíblia. Precisamos ser a Igreja escriturística. Testemunho de um bispo na aula sinodal: “Obtive Licenciatura no Instituto Bíblico de Roma, mas foram os pobres que me abriram mais ao vigor da Palavra”. (D. Emmanuel Lafont, Guiana Francesa). Os seminaristas devem abordar a Bíblia como livro da vida e não como livro de estudo. A vivência do evangelho é mais eloqüente que tantas palavras. Cada cristão deve ter a sua Bíblia.

Fonte: Dom Orlando Brandes

As aparências nem sempre enganam: beleza e teologia

A sabedoria popular soube cunhar breves ditados que exprimem grandes realidades. Alguns destes adágios contemplam a vaidade das exterioridades na vida humana: "as aparências enganam", ou ainda, "quem vê cara, não vê coração".

Com não menor brilho, os autores sagrados também recordaram em diversos lugares esta inegável verdade: "Não avalies um homem pela sua aparência, não desprezes um homem pelo seu aspecto" (Ec 11,2). Desta tendência nos advertiu o próprio Divino Mestre (Cf. Jo 7,24).

Sem contrariar esta incontestável verdade, pode-se dizer que nem sempre a exterioridade é desnecessária, pois a Sagrada Escritura, ao mesmo tempo que adverte contra a vaidade da beleza feminina, da juventude ou de qualquer outra forma deaparência, apresenta por mais de 50 vezes a palavra "esplendor" como atributo da grandeza divina; por sua vez, o Vaticano II relembra seu papel quatro vezes. A aparência, pois, não é supérflua para a teologia...

A análise das substâncias químicas demonstra que na maioria dos casos existe correspondência entre os elementos da natureza e sua aparência estética. Em razão desta realidade palpável, a metafísica tomista nos explica que a essência se coaduna com sua manifestação. Os transcendentais não são de tal forma distintos que se possam separar a verdade ou a bondade ontológicas da beleza. Existe, portanto, plena reversibilidade entre eles1. Portanto, o ente e o belo se identificam, pois "o pulchrum e o bonum em certo sujeito são idênticos, porque se fundam sobre a mesma coisa, a saber, sobre a forma, e por causa disto, o bem é louvado como belo"2. São Tomás não tem receio de ressaltar a preeminência do belo sobre a bondade na perspectiva do conhecimento: "o pulchrum supera o bonum na ordem cognoscitiva, porque o que é qualificado como bonum compraz simplesmente o apetite, enquanto que o que é denominado belo compraz a apreensão da coisa"3. De fato, as aparências nem sempre enganam...

Se a beleza é necessária à perfeita intelecção do universo criado, o é com muito maior razão para a teologia a qual tem como objeto o Ser em sua plenitude: Deus. A Via Pulchritudinis não apenas prova a existência divina, mas torna-se indispensável ao conhecimento completo de qualquer verdade, inclusive a católica. A beleza é, portanto, necessária ao estudo, ao ensino e ao aprofundamento da teologia.

De fato, o maravilhamento é o segredo didático a fim de descortinar o panorama da verdade, pois como ensina o Aquinense: "o pulchrum e o bonum são a causa do movimento das mentes e das almas"4. Já Santo Agostinho afirmava ser o amor o princípio, meio e fim de nossa vontade5, enquanto, segundo São Gregório Magno, somente com o amor se pode conhecer algo de forma perfeita6. Vemos, pois, que a beleza nos estudos teológicos é essencial para mover o coração humano à sede do conhecimento de Deus e de seu filho Unigênito. Quando se trata de considerar a essência e os atributos de Deus, de Jesus Cristo, da Igreja e de Maria, da natureza criada e do próprio homem, torna-se mister manifestar a sua beleza, pois sem ela não pode haver atratividade, nem amor, nem verdadeiro e pleno conhecimento teológico.

Um grande tomista do século XX, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, observava ser necessário que o bonum e o verum se tornassem conhecidos e amados, uma que vez existem. Se o homem não conhece apenas por meio de silogismos, mas possui instintos e sentidos que o levam a captar diretamente a realidade, não basta que o verum e o bonum sejam compreendidos por via dedutiva. Eles devem ser conhecidos também na ordem dos instintos e dos sentidos, tanto físicos quanto intelectivos. Para isso é necessário que o bem e a verdade se apresentem com beleza7. Ou os alunos de teologia sentem que, embora árdua, a via do esforço intelectual é bela e sublime, ou o ensino está fracassado. A pulcritude da teologia deve despertar no jovem a sede de heroísmo e de aprofundamento8.

Tendo este princípio como fundamento, os institutos de teologia e filosofia dos Arautos do Evangelho apresentam esta retrospectiva do ano de 2010 a fim de testemunhar o amor à verdade fortificado pelo impreterível papel da beleza.

O sacerdócio levítico no contexto histórico-bíblico

O sacerdócio levítico no contexto histórico-bíblico

Resumo

O presente artigo visa estudar, num primeiro plano, as características do Livro do Levítico, fornecendo elementos que possibilitem a compreensão do conceito sacerdotal contido no mesmo e o contexto no qual se insere o sacerdócio da Antiga Lei. O estudo culmina com o enfoque do sacerdócio neo-testamentário na plenitude de Cristo.

I - Aspectos circunstanciais acerca do Livro do Levítico

Um princípio metodológico para o estudo de textos refere-se às conjunturas em que um livro foi escrito. Antes propriamente de abri-lo e iniciar sua leitura, o pesquisador deve verificar a linha de pensamento do autor, procurar conhecer os traços gerais do livro, os objetivos com que escreve, quando foi escrito, etc. Desta forma, não se perde tempo em leituras desnecessárias e isso faz com que o grau de compreensão torne-se mais profundo. Este é o objetivo do primeiro ponto deste artigo: verificar as circunstâncias de um livro existente muito tempo antes do invento da imprensa.

O Livro do Levítico está inserido entre os cinco primeiros da Bíblia (Pentateuco). Esta coleção tem por essência apresentar os preceitos religiosos e legais involucrados em narrações históricas, sobretudo em relação com o início histórico do mundo, até alcançar a morte do profeta que via Deus face a face. É assim que Bover (1947, p. 39) descreve o papel dos preceitos legais - a Torá - no contexto bíblico:

A Torá ou Lei - É como o pórtico e, por sua vez, ao menos religiosamente, a medula de toda a Bíblia. Em essência está constituída por uma coleção de preceitos religiosos e disposições legais encadeadas em uma narração histórica que expõe os acontecimentos essenciais da pré-história do mundo, e mais particularmente de Israel, desde a criação até a morte de Moisés. 2

1. Origem do nome

O terceiro livro do Pentateuco havia recebido como nome a primeira palavra hebraica contida no mesmo (wayyiqr? = e chamou), aliás, como aconteceu com os outros quatro livros do Pentateuco. 3 Este livro, que trata de forma especial sobre o ritual do culto divino no santuário, carrega atualmente sobre si o nome de Levítico 4 devido à tribo de Levi. Nele estão descritos os deveres e direitos dessa mesma tribo. 5

2. Os elementos e a substância do livro

Pode-se dizer que o caráter geral do Levítico está na contemplação da ideia de santidade (de Deus), mas para isto é mister que seus ministros, por meio do culto, também apresentem essa santidade ritual e moral. 6

Entre as possíveis divisões do livro, apresentam-se as seguintes seções: (1-7) leis e instruções acerca dos sacrifícios; (8-10) consagração dos sacerdotes e primeiros sacrifícios; (11-15) prescrições a propósito da pureza; (16) ritual de purificação para o dia das expiações; (17-26) leis de santidade; (27) normas sobre as ofertas votivas e dízimos. 7

Quase se poderia dizer que todos os textos do Levítico versam acerca de legislação; excetua-se apenas um pequeno episódio (Lv 10, 1-5). 8 A santidade - como já se disse - é a ideia central deste livro; apresenta a santidade de Yahvé, cuja emanação deve atingir o povo eleito (Israel), sobretudo se tratando dos levitas (sacerdotes). Os sacerdotes, por sua consagração ao serviço direto a Yahvé, estavam obrigados de modo especial a um determinado caráter de vida. 9 Esse pensamento tem proeminência nos capítulos 17-26, sendo denominado de código de santidade.

A primeira parte do livro (1-7) diz respeito aos sacrifícios e às oferendas dos fiéis e de como os sacerdotes devem oferecê-las. Eis os tipos de sacrifícios desta primeira parte:

• o holocausto (‘olah), no qual se queima a vítima inteira sobre o altar (1, 3-17);
• as oblações (minjah), que são oferendas de flor de farinha, de incenso e de azeite - como complemento dos sacrifícios - (2, 1-16);
• os sacrifícios pacíficos (selem), em que são queimadas as gorduras no altar (3, 1-17);
• os sacrifícios expiatórios pelos pecados (jattah), (4, 1-5, 13) e pelos delitos (‘asam), (5, 14-6, 7).

Uma segunda parte tem caráter histórico-ritual (8-10) e trata sobre a consagração de Aarão e de seus filhos. Para os capítulos 11-16 é exigida a santidade aos israelitas como povo de Deus, portanto, versam sobre as impurezas. Essas leis foram compiladas depois de um momento de vivência por parte do povo, quer dizer, da tradição. 10

3. A composição redacional

Entre as hipóteses surgidas sobre a origem do Livro do Levítico, destaca-se neste trabalho a teoria da crítica independente, que nega toda a origem mosaica da legislação levítica, supondo sua origem estar na escola sacerdotal de influência do profeta Ezequiel nos tempos do cativeiro da Babilônia. Desta forma, esse livro é um documento sacerdotal, cuja compilação data de diferentes épocas. 11

Consideração de alguns dos elementos dessa possível redação. Lei de santidade: constitui um código à parte, como o código da aliança no Êxodo e o Deuteronômio, compreendendo os capítulos 17-26. Os três livros citados têm seu início pelas leis sobre os lugares de sacrifícios, ao mesmo tempo em que terminam com uma exortação e uma conclusão (Lv 26, 46). O código de santidade está composto também por outros elementos de diversas origens. 12 Acredita-se que sua composição foi pouco depois do Deuteronômio (séc. VI), devido a não se destacar a pessoa do sumo sacerdote como chefe supremo da hierarquia sacerdotal. Ademais, encontram-se muitas semelhanças com os textos de Ezequiel, o que faz supor que este mesmo autor seja o que escreveu a lei de santidade. 13 Entretanto, as discrepâncias encontradas entre ambos faz com que outros opinem ser a lei de santidade anterior a Ezequiel. Outro elemento essencial na redação do Levítico encontra-se na lei dos sacrifícios (1-7); supõe-se ser obra dos sacerdotes do Templo de Jerusalém. A lei da pureza ritual (11-15) aparece fora do contexto, fazendo uma interpolação indevida entre os capítulos 10 e 16. Sobre a lei do dia da expiação (16), não aparece nos tempos de Ezequiel, por isso, este ritual deveria acoplar-se aos elementos secundários do código sacerdotal: "Única seção histórica do livro". 14 O capítulo 27 - lei sobre os votos e dízimos - parece ser uma adição recente ao código sacerdotal, por ter manifesto caráter de apêndice. A consagração dos sacerdotes (8-10) é uma continuação de Ex 40, uma vez que Lv 8 também é cumprimento das ordens dadas em Ex 39; assim (8-10) forma parte fundamental do escrito do código sacerdotal.

Esses elementos do Levítico se tornam partes do documento sacerdotal do Pentateuco. Isto se supõe ter ocorrido no séc. V a.C., no tempo de Esdras, tornando-o livro religioso do Templo. A piedade judaica o remontava aos tempos de Moisés, por ser este livro um manual de ritual e piedade, verdadeiro guia tanto do povo como dos sacerdotes em sua inter-relação com a divindade. Ele foi elaborado no decurso de alguns séculos, sendo suas prescrições recolhidas, adaptadas e agrupadas. 15

Com base nos autores acatólicos, o Levítico não tem nenhuma relação com Moisés, uma vez que foi escrito pela época do exílio (pouco antes ou depois). Posto num plano evolutivo em consideração ao Êxodo (código da aliança: 20-23) e ao Deuteronômio, ele é tido por um término desse processo. Nesta concepção, o santuário, o sacerdócio, os sacrifícios, as festas 16, etc., fazem parte apenas de um processo histórico, cuja evolução se caracteriza, sobretudo, sob o ponto de vista legislativo. 17

Em contrapartida, os autores católicos defendem - embora de diferentes maneiras - a autenticidade mosaica da legislação levítica. Para alguns, essa autenticidade é integral, inclusive em sua redação; outros, porém, mais modernos, defendem que ela deve ser vista em seu aspecto substancial (qualitativo), em que elementos essenciais do Levítico remontam à época mosaica. Se Moisés foi mediador entre Yahvé e Israel, como transmissor de princípios fundamentais da religião, era necessário um núcleo de leis - contendo seu espírito - passíveis de desenvolvimento. 18 Entre os autores dessa corrente encontra-se Lagrange, que defende a ideia de uma originalidade mosaica da legislação, por onde o código sacerdotal é uma conclusão normal e posterior a ela, tanto em sua redação como em seu tema especial. 19 Essa lei bem pode ser a condensação da vida cultual de Israel, desde Moisés até a Babilônia, sendo recopilada pelos sacerdotes. No entanto, a tradição sacerdotal teve de tomar como base uma tradição sinaítica, não morta, mas parte integrante da vida nacional, possibilitando um desenvolvimento posterior. 20

O autor do Levítico recolheu textos antigos, com rituais de purificação também antigos, e redatou uma nova liturgia. Pode-se dizer que é de cunho mosaico em seu conteúdo religioso.

Encontra-se em algumas leis um paralelo com documentos pré-mosaicos, como os de Ugarit e Nuzi, o que mostra ser esta atividade literária plenamente conciliável com o código legislativo do Levítico. 21 Esses rituais fazem das festas agrícolas praticamente todo o seu ciclo litúrgico, do que se presume um processo de sedentarização, da qual não gozavam na época mosaica. Apesar dos numerosos pontos de contato dessa síntese com Ezequiel, também é pouco provável que toda ela seja posterior ao cativeiro. No entanto, a lei da santidade parece ter sido codificada no final do período da monarquia - em semelhança com o Deuteronômio. As outras leis são mais difíceis de serem precisadas, apesar de a crítica datá-las como posteriores à Torá de Ezequiel (40-48). Entre as sínteses particulares e a grande síntese do Levítico, não se tem certeza de sua redação; porém, o espírito do redator é conservador, preocupado em manter os costumes anteriores ao exílio, mais que tentar uma reforma. Estas noções de uma lei revelada, em verdade, provêm do espírito mosaico. 22

A interpretação crítica sobre a redação do Pentateuco atribuída a Moisés é assim descrita pela Pontifícia Comissão Bíblica, em 27 de junho de 1906 (DZ 3395-3397):

Pergunta 2: será que a autenticidade mosaica do Pentateuco exige necessariamente uma redação tal de toda a obra que se deve pensar sem restrição que Moisés o escreveu todo, com todos os seus pormenores, seja de próprio punho, seja ditando a seus amanuenses? Ou pode-se admitir a hipótese dos que pensam que Moisés encomendou a escritura da obra por ele concebida sob inspiração divina a outro ou outros, de tal modo, porém, que expressassem fielmente seus pensamentos, nada escrevessem contra sua vontade, nada omitissem e, finalmente, a obra assim composta, aprovada por Moisés, seu principal e inspirado autor, fosse divulgada sob o seu nome? Resp.: Não, quanto à primeira parte; sim, quanto à segunda [...].

Pergunta 4: Pode-se admitir, salva a autenticidade mosaica essencial e a integridade do Pentateuco, que talvez, em tão prolongado processo multissecular, tenham acontecido nele algumas modificações, como: adições feitas depois da morte de Moisés ou acrescentadas por um autor inspirado, ou glosas ou explicações inseridas no texto, vocábulos ou formas de língua antiga transpostas para linguagem mais moderna, enfim, lições erradas que se devem atribuir a defeito de amanuenses, as quais licitamente podem ser discutidas e julgadas de acordo com as normas da crítica?
Resp.: Sim, salvo o juízo da Igreja. 23

4. Contexto bíblico do Levítico

O Livro do Levítico encontra complemento em Ezequiel, em prescrições do já existente código de santidade, e direciona muitas normas da legislação sacerdotal: no que se refere aos aspectos sacrificais, do sacerdócio e da pureza. Além deste profeta, no Livro do Eclesiástico (50, 5-21) tem-se a memória das festas de expiação, 24 em sua liturgia; ademais de conter alguns ritos das ofertas dos sacrifícios. 25

No Novo Testamento, com o advento da Nova Aliança, os sacrifícios e leis do Levítico - o antigo ritual - cederiam lugar. Esta lei foi tão válida no Antigo Testamento que somente Jesus poderia aperfeiçoá-la. O fato de algumas tendências religiosas criarem casuísticas transformando a lei em arbitrária e pura letra, fez com que em algumas ocasiões Jesus se visse obrigado a ter reação contrária a ela. 26 No entanto, o próprio Jesus se sujeitou à lei, 27 com o intuito de dar-lhe pleno cumprimento. 28 A clave interpretativa da lei tornou-se o amor. 29

5. A teologia contida no livro

Para os críticos independentes, o conteúdo levítico está num estágio inferior à mensagem profética, por ser esta última a base ética da qual se serviram os fariseus dos tempos de Jesus. No entanto, esta posição não se sustenta quando se leva em conta que o Levítico contém aspectos dogmáticos e morais da religião mosaica. Os sacerdotes são os destinatários do Levítico, portanto, encarregados dos deveres cultuais; os profetas não se preocupavam com esses deveres, uma vez que já havia encarregados para isto. Assim, a concepção teocrática do Levítico expressa a vida de Israel em torno do culto, baseando-se nas verdades religiosas e éticas de outros livros (v. gr. Deuteronômio). 30

As leis são anunciadas por Moisés, o grande legislador, e entre elas algumas têm suas origens anteriores a ele mesmo, mas ganham realce por seu meio, uma vez que sua intenção era mostrar ao povo a santidade de Yahvé. Por meio desta, queria o legislador evitar a mescla da nação sacerdotal com as gentis, impedindo sua contaminação. Portanto, a ideia transmitida não podia ser outra que a de santidade, sendo o próprio Yahvé o padrão e paradigma dela. 31 Como nação consagrada ao Senhor, recebia o título de primogênita 32 e de reino sacerdotal; 33 o que lhes privava de tomar as mesmas atitudes de outras nações. 34 E a forma de obter isto era praticar os preceitos de Yahvé. 35 No entanto, dentro dessa nação primogênita, havia uma classe sacerdotal encarregada de praticar e divulgar a expressão da santidade.

Encontram-se no Levítico apreciações morais dignas de uma tradição profética ou deuteronômica das melhores; o que exclui a concepção de nomismo formalista da qual foi acusado o livro. Dentre essas apreciações podem-se contemplar os deveres para com o próximo, as proibições de furto, a mentira e o ardil (19, 11; 35-36); o respeito para com os pais e o sábado (19, 3) e com os desvalidos (19, 14); ficam vetados o rancor e a vingança (19, 17-18); inclusive se prega o amor ao estrangeiro como se ele fosse um membro do povo (19, 33-34).

Com relação aos sacrifícios, estes tinham uma finalidade religiosa e com eles se demonstrava a adoração e submissão a Deus. A ideia de sacrifício valia para o povos semitas e - inclusive - não-semitas. 36 Para os israelitas os sacrifícios estão permeados de sentido religioso: como a adoração, o reconhecimento pelos benefícios, o sentido de expiação, a súplica. São Tomás (S. Th. III, q. 22, a. 2, resp.) descreve três motivos para que haja o sacrifício:

O homem, portanto, tem necessidade do sacrifício por três motivos: 1. Para a remissão do pecado que o afasta de Deus. Por isso, diz o Apóstolo, na Carta aos Hebreus, que cabe ao sacerdote "oferecer dons e sacrifícios pelos pecados". - 2. Para que o homem possa conservar-se no estado de graça, sempre unido a Deus, no que consiste a sua paz e salvação. Por isso, na antiga lei se imolavam vítimas pacíficas pela salvação dos que as ofereciam, como prescrevia o livro do Levítico. - 3. Para que o espírito do homem seja perfeitamente unido a Deus, como acontecerá, sobretudo, na glória. Por isso, na antiga lei, era oferecido o holocausto em que tudo era queimado, como relata o Levítico. 37

Por meio dos sacrifícios o povo deveria viver nesta comunicação com o sobrenatural, onde ganhariam um sentido moral suas atitudes. Castanho (1990, p. 53-54) descreve o fenômeno religioso em Israel e sua superioridade sobre as demais religiões existentes:

O livro do Levítico revela a superioridade da religião mosaica, sobre todas as demais religiões da antiguidade. Os judeus sabiam que o seu Deus era santo e que o culto a Deus deveria ser tratado com o máximo de respeito. Como todos os demais povos, havia em Israel, e antes mesmo no deserto, sacerdotes, sacrifícios e outros ritos cultuais. O fenômeno religioso é universal no espaço e no tempo, é uma exigência da natureza, da inteligência e do coração humanos. 38

Tempos depois os profetas anunciam uma degeneração desse sentido sacrifical (Am 5, 22; Os 8, 13; Jr 5, 20); o povo fazia-o por pura formalidade, seu coração já não estava voltado ao sentido original, criando uma teatralidade do mesmo ato. 39

Apesar de uma tentativa da crítica de diminuir o valor religioso do Levítico, esta legislação contém um sentido religioso e ético integrantes ao povo e que em nada desmerece a tradição profética. As instituições e prescrições que fazem parte deste livro não se circunscrevem ao mero formalismo de um cerimonial, mas reavivam o sentido de adoração a Yahvé, o que faz dele, juntamente com as exortações do Deuteronômio e o discurso profético, parte da consciência do povo judeu. Isto salvaguarda a vida religiosa e monoteísta do povo, protegendo-o da influência gentílica. Se o papel dessa legislação foi preponderante no momento subsequente ao exílio, não foi menos em sua situação precedente. Com o decorrer da história judaica, as leis foram se tornando pesadas por uma casuística farisaica, por meio da qual as adições orais sobrecarregaram a lei desviando seu verdadeiro sentido. Mais tarde São Paulo mostrará o papel da lei como pedagogo até o advento de Cristo. Assim, ela foi a disciplina encarregada de conservar a verdadeira fé em Deus e à Sua vontade. 40

II - O sacerdócio levítico e o contexto bíblico

1. Definição

Sacerdote 41 - do termo hebraico (??h?n) - tem sua etimologia discutida. Não possui forma feminina, pelo fato de nunca ter havido sacerdotisas em Israel - como entre outros semitas. Para Israel o termo "levita" frequentemente era entendido no sentido sacerdotal, mas nem sempre. 42 Pode ser entendido como aquele que está diante de Deus como servidor; 43 o que se inclina ou aquele que procura a prosperidade. 44 Ainda pode ser designado, segundo SABBAG (2005, p. 366), como "pessoa especialmente destinada e preparada para servir de liame entre o que é divino e a humanidade; ou aquele que se devota de alma e coração a uma causa sagrada". 45

Na visualização tomista, o sacerdote é o mediador entre Deus e o povo. Para o povo entrega as coisas divinas e para Deus oferece as orações pelos pecados.

O ofício próprio do sacerdote é ser mediador entre Deus e o povo, enquanto entrega ao povo as coisas divinas [...] Além disso, o sacerdote é mediador enquanto oferece a Deus as orações do povo e de alguma forma satisfaz a Deus pelos seus pecados (S. Th. III, q. 22, a. 1, resp.).

2. A ordenação e santidade do sacerdócio levítico

No Levítico o sacerdote está intimamente ligado com o conceito de sacrifício. É aquele que oferece sacrifícios pelos pecados (Lv 6, 7). O discurso de Moisés (Lv 6, 1) deve dirigir-se para Aarão e seus filhos.

Os sacerdotes deveriam passar por uma solene ordenação à entrada da tenda da reunião (Lv 8, 3), cujo cerimonial inclui a investidura e unção (Lv 8, 7-13), três sacrifícios (Lv 8, 14-36), e a observância do dia oitavo (Lv 9), além de conter rituais adicionais (Lv 10). Esta era uma cerimônia tripartite, sendo constituída de uma purificação, ordenação e consagração. 46 O aspecto sacrifical da cerimônia, que fazia parte da ordenação, constava de um sacrifício pelo pecado (Lv 8, 14-17), um holocausto (Lv 8, 18-21) e outro para a ordenação (Lv 8, 22-36).

A estrutura do culto sacerdotal por meio do sacrifício oferece um movimento ternário, por onde o sacerdote torna-se o intermediário entre Deus e o povo. Esse movimento consta de uma fase ascendente, uma central e outra descendente, segundo Terra (1996, p. 62):

A fase ascendente compreende todo o sistema das separações rituais, das diversas regras de pureza, até as ofertas sacrificais, passando pelos ritos de purificação e de consagração.

A fase central ou de encontro é o elemento decisivo no culto e consiste no encontro do sacerdote com Deus; graças ao sacrifício aceito, o sacerdote é admitido na habitação de Deus.

A fase descendente resulta do bom relacionamento estabelecido entre o sacerdote e Deus. O sacerdote obtém o perdão divino e o fim dos castigos provocados pelos pecados; pode comunicar ao povo as instruções divinas que revelam o caminho certo a ser seguido para lograr a vitória na vida; pode abençoar o povo com o nome de Deus para propiciar-lhe fecundidade, paz e felicidade. 47

O v. 33 (permanência à entrada da tenda da reunião) apresenta-se como sendo o cume da cerimônia. 48 O término da ordenação dá-se com a bênção solene de Aarão (Lv 9, 22). A aceitação do sacerdócio - por parte de Deus - no rito de ordenação e os sacrifícios manifesta-se com a teofania no capítulo 9: "E a glória do Senhor apareceu a todo o povo. Saiu um fogo de diante do Senhor que devorou no altar o holocausto e as gorduras. Vendo isso, todo o povo soltou gritos de júbilo e prostrou-se com a face por terra" (Lv 9, 23b-24).

No entanto, aquele que oferece sacrifícios deve ser santo. E é esse o tema do capítulo 21 (a santidade do sacerdócio), envolvendo regras de como o sacerdote deve manter a pureza, 49 a fim de oferecer sacrifícios. Esta santidade descrita no capítulo 21 corresponde num primeiro plano a regras gerais para os sacerdotes (Lv 21, 1-9). O que poderia ser tolerável para uma pessoa qualquer do povo, não o era para o sacerdote, devido ao alto serviço que prestava a Deus.

Os versículos 10-15 não se referem ao sumo sacerdote, surgido no período pós-exílico, 50 mas denota uma concepção hierarquizante do sacerdócio, o que pressupõe algo da reforma de Josias (621 a.C.). O versículo 10 talvez não seja suficiente para significar esse título numa existência pré-exílica; de qualquer forma, o sacerdote destacado deve ser mais radical no tocante às normas de sepultamento - inclusive de seus parentes próximos - não podendo abandonar o santuário nem nesta ocasião (Lv 21, 10-13). Por outro lado, a escolha do cônjuge deve ser tomada com um significado especial. A LXX trás a expressão "do seu próprio povo" (ek tou genous autou), o que mantém a pureza da linhagem levítica. 51

A terceira parte deste capítulo expressa a integridade que o sacerdote deve possuir, não somente espiritual, mas, inclusive, física. Assim como os animais a serem oferecidos não podiam conter imperfeições, da mesma forma deveria ser o sacerdote. Caso um sacerdote possuísse alguma imperfeição, esta o privaria do oferecimento direto a Deus (v. 21b), mas lhe era permitido comer das ofertas (v. 22).

Nesta visualização o sacerdote é aquele escolhido por Deus para ser o mediador entre Ele e o povo. Tal mediação deve ser feita por meio do culto sacrifical e, para isto, o sacerdote deve estar em condições para realizá-lo, ou seja, em estado de santidade.

3. A história do sacerdócio no contexto bíblico

Antes mesmo da instituição do sacerdócio na Bíblia, outros povos exerciam esta função, formando uma hierarquia organizada e hereditária; assim descreve George (1972, p. 924) esse aspecto:

Entre os povos civilizados que cercam Israel, a função sacerdotal é muitas vezes exercida pelo rei, notadamente na Mesopotâmia e no Egito; o rei é então assistido por um clero hierarquizado, no mais das vezes hereditário, que constitui uma verdadeira casta. Não há nada disso entre os patriarcas. Não existe então nem templo, nem sacerdotes especializados do Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó. 52

No Antigo Testamento as fontes sacerdotais são de dois tipos: de forma narrativa e de leis. 53 Numa primeira visualização acerca do sacerdócio no contexto bíblico, não se encontra o aspecto sacrifical - que depois veio a ser exercido -, mas o serviço da adivinhação 54 e a instrução sobre a Torá. 55 Segundo Monloubou (2003, p. 704): "Tanto quanto os profetas, os sacerdotes são moralistas que ensinam o povo a se dispor ao culto e a prolongar os efeitos por uma conduta digna". 56Ademais, os chefes de cada família tinham o poder de sacrificar; 57 aliás, como foi o caso do próprio Jetro - sogro de Moisés - que ofereceu holocausto e sacrifício no Sinai, depois comeu com Aarão e os anciãos de Israel. 58

A origem levítica provavelmente remonta a um ramo sacerdotal oriundo de Cades, com os quais Moisés mantinha relações firmes. 59 Eles alegavam possuir a origem sacerdotal exclusiva. 60 Juridicamente não possuíam terras, 61 por serem da tribo escolhida, mas zelavam pela tradição das leis sagradas dentro do povo. 62 A pessoa de Moisés era considerada levita. 63

Sobre a origem levítica de Aarão ocorrem controvérsias. Em Ex 4, 13-16 ele é considerado levita e irmão de Moisés; no entanto, ora se torna intercessor junto a Moisés (Nm 12, 11-12), ora assume a condição de sacerdote de um bezerro de ouro idolátrico (Ex 32, 1-5). Este fato ligado à contenda entre Roboão e Jeroboão faz com que Aarão seja uma espécie de precursor do sacerdócio em Betel, pois Jeroboão também construiu um bezerro de ouro em Betel e outro em Dã e estabeleceu sacerdotes do meio do povo que não eram levitas. 64

Num período pré-monárquico em que ainda não havia rei, cada qual fazia o que lhe parecia melhor; foi assim que Mica, da montanha de Efraim, convidou um levita para tornar-se seu sacerdote, após a fundição de um ídolo com 200 moedas de prata encomendado por sua mãe. 65 A imagem fundida com as 200 moedas e o sacerdote levita foram mais tarde sequestrados pela tribo de Dã, que queria estabelecer-se na cidade de Laís. O levita alegrou-se por se tornar como que pai e sacerdote de uma tribo em vez de uma família. Jônatas, filho de Gerson, filho de Manassés, constituiu-se, juntamente com seus filhos, sacerdote da tribo de Dã até o dia do cativeiro. O que tem como intento a legitimidade do sacerdócio, remontando-o até Moisés. Isto se passou enquanto a casa de Deus estava em Silo, 66 onde Eli desempenhava o ofício sacerdotal por meio de sacrifícios e holocaustos. 67 Após o declínio da família de Eli, tem-se notícia de uma cidade sacerdotal em Nobe. O chefe desta família, o sacerdote Aquimelec, dá alimento a Davi e seus companheiros. Por esse motivo, Saul determina que toda sua família seja exterminada, exceto Abiatar que se refugia com Davi. 68

Entrando no período monárquico, o sacerdócio ganha estruturação e a partir daí o culto no Templo torna-se vigoroso. 69 Salomão organiza a estrutura de seu reino e com isso o culto fica centralizado no Templo em Jerusalém. 70 No entanto, com o cisma samaritano os cultos locais ganham novamente realce. 71 Nessa época o sacerdócio e a monarquia tinham uma firme aliança, como mostra o massacre dos filhos de Acab, no qual Jeú extermina a todos, inclusive os sacerdotes que serviam o rei. 72 Isto não se passava somente em Israel, mas também em Judá, como o caso do refugiado Joás, que ficou seis anos escondido no Templo e depois, com a conspiração do sacerdote Jojada, torna-se rei. 73

As classes sacerdotais formadas em comunhão com a monarquia foram respectivamente deportadas pelos conquistadores de seus reinos. Israel caiu com a invasão assíria e colonos se estabeleceram na Samaria. 74 Algum tempo depois, sacerdotes são trazidos da deportação para ensinar a religião aos colonos, 75 Judá é conquistada por Nabucodonosor e Sedecias, deportado para a Babilônia. 76 Inclusive o sumo sacerdote Saraías e Sofonias, segundo sacerdote, são levados para o cativeiro. 77

Um passo importante para o sacerdócio de Judá, ocorrido antes da deportação para a Babilônia, deu-se com a descoberta do livro da aliança no Templo, pelo sumo sacerdote Helcias. Após as palavras da profetisa Holda, o rei Josias promoveu uma reforma geral no culto: renovando a aliança com Deus, ele ordenou a Helcias, aos sacerdotes de segunda ordem e aos porteiros que limpassem o Templo de todos os objetos idolátricos que lá havia; despediu os sacerdotes idólatras e os que adoravam os astros do céu e mandou profanar os lugares que tinham sido objeto de culto idolátrico, unificando, dessa forma, o culto ao Deus verdadeiro no templo de Jerusalém. 78

Na época exílica, com a condensação da lei sacerdotal levítica, ficou assegurado que a tribo sacerdotal por excelência seria a de Levi, 79 e mesmo assim nem todos os levitas seriam sacerdotes. 80 A Aarão e seus filhos ficou reservada a função de sumo sacerdote. 81 No entanto, Ezequiel, ao divisar o "novo Israel" (capítulos 40-48) recorda que os levitas abandonaram o culto verdadeiro para seguir a ídolos, por isso, apenas teriam funções menores dentro do Templo. 82 Os cargos mais importantes, inclusive o de sumo sacerdote, estão reservados aos levitas descendentes de Sadoc, que permaneceram fiéis ao santuário enquanto os israelitas se afastavam. 83 Sadoc foi sacerdote pré-davídico da linhagem de Eleazar, filho de Aarão. 84 Segundo Born (2004, p. 1352):

Sob Davi aparece uma nova família, a de Sadoc, de origem obscura, mas na tradição sacerdotal ligada com Eleazar, filho mais velho de Aarão. Essa família suplantou a de Eli (1 Sm 2, 27-36) e outras que eram consideradas como descendentes do terceiro e do quarto filhos de Aarão, Nadab e Abiu, e obteve afinal a hegemonia em Jerusalém.

A reconstrução pós-exílica levou em conta esta declaração de Ezequiel, o que tornou os sadoquitas sacerdotes principais, enquanto à descendência de Arão coube a parte do sacerdócio comum e os genitores levitas ficaram sendo os servos do Templo. 85 Além da restauração e centralização do culto no Templo, a leitura e explicação da lei passou a ter um realce cada vez maior. Agora não só o aspecto sacrifical era preponderante, mas a especialização legalista das Escrituras Sagradas se torna cada vez mais relevante. 86 Essa concepção legalista mais tarde ultrapassa a própria dignidade sacerdotal.

À época do Messias, os sacerdotes já estavam categorizados segundo normas anteriores. Para os sacerdotes comuns havia 24 divisões de serviços, 87 os quais poderiam exercer outras funções no tempo vago. 88 Geralmente faziam as leituras e explicações da Torá nas sinagogas e eram encarregados das questões de pureza ritual. 89 A hierarquia estabelecida funcionava de forma hereditária. Portanto, a separação entre os sacerdotes principais e os sacerdotes comuns era bem acentuada. Os levitas dessa época que deveriam viver em cidades levíticas, 90 tinham como funções a de cantores 91 e demais serviços do Templo. 92

4. O sacerdócio no Novo Testamento

No Novo Testamento o substantivo hiereus (sacerdote) é empregado 31 vezes, das quais 14 na carta aos Hebreus. Marcos a emprega duas vezes, Mateus três e Lucas oito vezes (cinco no Evangelho e três em Atos). No Evangelho de João encontra-se apenas uma vez (1, 19) e três no Apocalipse. Note-se que nas cartas do Novo Testamento a única que leva esse termo é em Hebreus, as demais não o utilizam. Quando se fala em sacerdote no Novo Testamento, pode-se estar referindo aos pagãos (At 14, 13) ou aos sacerdotes judeus. 93

Os contatos de Jesus com sacerdotes não eram frequentes; ocorriam quando mandava aqueles a quem havia curado mostrarem-se a eles, 94 devido aos conceitos de purificação ritual, os quais declaravam a pessoa isenta de impurezas e apta a frequentar novamente a sociedade. Ao mesmo tempo isto servia para a afirmação da autoridade de Jesus. 95

A parábola do bom samaritano (Lc 10, 25-37) apresenta uma crítica aos sacerdotes (v. 31) que promoviam simplesmente um culto externo. O evangelho de Mateus (12, 4), com seu paralelo em Marcos 2, 26 e Lucas 6, 4, mostra como o rei David comeu os pães da proposição - que lhes era proibido - e Mateus aproveita para afirmar o senhorio de Jesus sobre o sábado e o Templo, alegando que os sacerdotes também rompem o sábado para exercer suas funções. Para essa afirmação de Jesus é dado como argumento a própria Sagrada Escritura. 96 A relação positiva de Jesus com os sacerdotes e levitas em relação ao acontecimento da salvação somente se verifica em Lucas (1, 5; 8) e Atos (6, 7). 97

Nos Evangelhos sinóticos Jesus nunca atribui a Si mesmo o título de sacerdote, preferindo utilizar a expressão "Filho" ou "Filho do Homem"; desta forma, faz uma distinção clara entre Sua missão e a dos sacerdotes aarônico e levítico. No entanto, Sua missão está envolta de conceitos sacerdotais. 98

O fato mais esclarecedor da ação sacerdotal implícita e figurada de Jesus encontra-se na Sua morte. Segundo George (1972, p. 928-929):

Para seus inimigos, esta é o castigo dum blasfemo; para seus discípulos, um fracasso escandaloso. Para ele, ela é um sacrifício que ele descreve com as figuras do Antigo Testamento: compara-a ora com o sacrifício expiatório do Servo de Deus (Mc 10, 45; 14, 24; cf. Is 53), ora com o sacrifício de Aliança de Moisés ao pé do Sinai (Mc 14, 24; cf. Ex 24, 8); e o sangue que ele dá no tempo da Páscoa evoca o do cordeiro pascal (Mc 14, 24; cf. Ex 12, 7.13.22s). Essa morte que lhe infligem é por ele aceita; ele próprio a oferece como o sacerdote oferece a vítima; e é por isso que ele dela espera a expiação dos pecados, a instauração da nova Aliança, a salvação de seu povo. Numa palavra, ele é o sacerdote de seu próprio sacrifício.

Acerca da segunda função sacerdotal do Antigo Testamento, o serviço da Torá; Jesus não veio bani-la, mas aperfeiçoá-la (Mt 5, 17s). Ele supera a letra, mostrando no primeiro e segundo mandamentos seu valor mais profundo (Mt 22, 34-40). Com isso, manifesta o prolongamento do sacerdócio do Antigo Testamento ao mesmo tempo em que torna evidente sua superação pela definitiva revelação do Evangelho da salvação e realização da Lei. 99

Em João, no capítulo 17, destaca-se a chamada "oração sacerdotal", em que Jesus pede por Si (v. 1-5), pelos discípulos (v. 6-19) e pela unidade dos futuros cristãos (v. 20-26). Esse capítulo não traz o termo "sacerdote", mas pode ser comparado ao dia da Expiação (Lv 16, 17), pelo fato de Jesus estar se preparando para a morte.

Ao falar sobre a morte de Jesus, São Paulo evoca as figuras do cordeiro pascal (1 Cor 5, 7), da humilhação do Servo (Fl 2, 6-11), do dia da Expiação (Rm 3, 24ss). A morte de Cristo significa para o Apóstolo o sacrifício supremo, que Ele mesmo ofereceu; assim se encontram termos como a comunhão do sangue de Cristo (1 Cor 10, 16-22) e da redenção por meio dele (Rm 5, 9; Cl 1, 20; Ef 1, 7). Também em Romanos 3, 25, outra expressão do culto sacrifical é utilizada por São Paulo: "Deus o destinou para ser, pelo seu sangue, vítima de propiciação mediante a fé". Acerca da oblação sacrifical de Cristo, o Apóstolo a descreve em Ef 5, 2 e Gl 2, 20. Da mesma forma como o próprio Jesus não Se intitulou sacerdote, São Paulo também não o faz. 100 Somente na carta aos Hebreus é que isto ocorre.

Em Hebreus 4, 14, Cristo recebe o título de Sumo Sacerdote. O pontífice é escolhido não para si mesmo, mas em favor dos homens (5, 1). Sendo mediador, ele não o é por escolha própria, senão por meio de um chamado, como no caso de Aarão (5, 4). "Assim também Cristo não se atribuiu a si mesmo a glória de ser pontífice. Esta lhe foi dada por aquele que lhe disse: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei (Sl 2, 7)" (Hb 5, 5). No entanto, Cristo não está na condição pontifical da linhagem aarônica, pois sendo o autor da salvação, "Deus o proclamou sacerdote segundo a ordem de Melquisedec" (Hb 5, 10). Melquisedec aparece na História sem uma origem definida, "sem pai, sem mãe, sem genealogia, a sua vida não tem começo nem fim; comparável sob todos os pontos ao Filho de Deus, permanece sacerdote para sempre" (Hb 7, 3).

Abraão é posto como inferior a Melquisedec, pois "é o inferior que recebe a bênção do que é superior" (Hb 7, 7). Nessa perspectiva a mudança trazida pelo novo sacerdócio - da ordem de Aarão para Melquisedec - obriga o aperfeiçoamento da Lei (Hb 7, 11-12). De outra forma, a Lei já teria atingido sua plenitude na linhagem levítica.

Para São Tomás, o motivo pelo qual Cristo é da ordem de Melquisedec e não da linhagem levítica se dá por dois motivos, como explana (S. Th. III, q. 22, a. 6, resp.):

Já foi dito que o sacerdócio da lei era a prefiguração do sacerdócio de Cristo, não de maneira adequada à verdade, mas de maneira muito deficiente. Por duas razões: quer porque o sacerdócio da lei não purificava os pecados, quer porque não era eterno, como o sacerdócio de Cristo. Ora, a superioridade do sacerdócio de Cristo, com relação ao sacerdócio levítico, estava prefigurada no sacerdócio de Melquisedec que recebeu o dízimo de Abraão, de quem, de alguma forma, o sacerdócio levítico dependia. Por causa desta superioridade do verdadeiro sacerdócio com relação ao sacerdócio prefigurativo da lei, se diz que o sacerdócio de Cristo é segundo a ordem de Melquisedec.

A aliança feita por Cristo é mais excelente e perfeita que a antiga (Hb 8, 6). Ela tem como base o próprio sangue de Cristo (Hb 9, 14); "por isso ele é mediador do novo testamento" (Hb 9, 15). A Lei antiga era apenas sombra dos bens que viriam, pois os sacrifícios eram renovados indefinidamente (Hb 10, 1), mas agora uma só oblação - por meio de Cristo - realizou a perfeição definitiva (Hb 10, 14).

Cristo é ao mesmo tempo a pedra viva - rejeitada pelos homens, mas escolhida por Deus - desse edifício espiritual (1 Pd 2, 4-5). Assim, se encontrará na carta de São Pedro a relação do sacerdócio de Cristo como um novo povo adquirido por Deus e ao qual santificou, tirando das trevas para a luz, denominado "sacerdócio régio" (1 Pd 2, 9). Esta é a expressão do pensamento contido em Êxodo 19, 6. O sacerdócio é visto aqui como acesso ao conhecimento de Deus, e o seu papel profético consiste em proclamar essa visão íntima. Agora, o sacerdócio cristão toma o lugar do judaico; no entanto, expressões fundamentais do ritual levítico, passam para a igreja primitiva e são utilizados pelos cristãos, tais como: aspergido, lavado, primogênito, altar etc. 101 Em Apocalipse (1, 6; 5, 10; 20, 6) também está expressada a ideia do reino sacerdotal de Êxodo 19, 6. A comunidade se beneficia da dignidade sacerdotal como parte da dignidade real concedida por Deus, por meio de Seu Cristo. Esse sentido sacerdotal não se deve à relação com o Templo, pois este não existirá na Jerusalém Celeste (Ap 21,22), mas o próprio Deus e o Cordeiro irão assumir a função de Templo. 102

No Novo Testamento Jesus nunca denomina qualquer de seus seguidores com o título de sacerdote, mas da mesma forma que no Antigo Testamento, somente são Seus ministros aqueles a quem Deus chama. O chamamento dos doze, a transmissão de poderes (Mt 10, 8.40; 18, 18) e a entrega da Eucaristia (Lc 22, 19) já se torna uma participação específica do sacerdócio. 103

As explicações ulteriores da tradição tomam como base a compreensão dos apóstolos acerca do ministério sagrado, que ao mesmo tempo não prejudica o sacerdócio de Cristo nem o dos fiéis. 104 Assim descreve este pensamento George (1972, p. 931):

Os Apóstolos o compreendem. Eles estabelecem por sua vez responsáveis para prolongar sua própria ação. Alguns destes últimos trazem o título de Anciãos, que é a origem do nome atual dos sacerdotes (presbíteros: At 14, 23; 20, 17; Tt 1, 5). A reflexão de Paulo sobre o apostolado e os carismas já se orienta para o sacerdócio dos ministros da Igreja. Aos responsáveis pelas comunidades ele dá títulos sacerdotais: "administradores dos mistérios de Deus" (1 Cor 4, 1s), "ministros da nova Aliança" (2 Cor 3, 6); ele define a pregação apostólica como um serviço litúrgico (Rm 1, 9; 15, 15s). Aí está o ponto de partida das ulteriores explicações da tradição sobre o sacerdócio ministerial. Este não constitui, portanto, uma casta de privilegiados. Não significa prejuízo nem para o sacerdócio único de Cristo nem para o sacerdócio dos fiéis. Mas, a serviço dum e de outro, ele é uma das mediações que garantem o serviço do povo de Deus.

No Novo Testamento tem-se, portanto, uma inter-relação do sacerdócio instituído com o sacerdócio de Cristo (expressão da plenitude sacerdotal) e com o sacerdócio régio da comunidade. Essa relação constante e efetiva entre o divino e o humano é o resultado da mediação sacerdotal levada à perfeição.

Conclusão

A questão sacerdotal na Bíblia contém um aspecto misterioso, mas que deixa os homens estupefatos por perceber que Deus não segue esquemas humanos. Natural seria que a li nhagem sacerdotal neo-testamentária seguisse a estirpe levítica. Não obstante, o Messias é da família de Judá, cujo sacerdócio é atribuído a Melquisedec. Essa consideração não invalida o sacerdócio vetero-testamentário aarônico, mas o valoriza.

Certo artista que inicie um grande empreendimento pictórico, mas perceba haver um aperfeiçoamento em sua obra por parte de um terceiro, deve admirar o estágio final que ela venha a adquirir; isto se, realmente buscava a excelência da obra e não uma vanglória pessoal. Da mesma forma o sacerdócio iniciado no Antigo Testamento foi aperfeiçoado por Cristo, mas este respeitou a "pintura" do iniciador da obra; o sacerdócio cristão tomou como fundamento muitos dos conceitos utilizados pelo sacerdócio levítico. Do que era imperfeito, atingiu a plenitude. Essa visão deve permear o estudo sacerdotal para se compreender a unidade salvífica na história bíblica.

Fonte: Thiago de Oliveira Geraldo - 2011/07/19

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